"OS OLHOS SÃO órgãos marotos. Mesmo perfeitos, não são dignos de confiança.
“Não vemos o que vemos; vemos o que somos”, escreveu Bernardo Soares.
A gente pensa que os olhos põem dentro o que está longe, lá fora, quando o que os olhos fazem é por lá longe o que está dentro.
É o caso dos olhos do pai e os olhos do apaixonado por sua filha… Olho de pai é olho que se educou com a vida. Conhece a menina, viu-a nascer, crescer, voar, cair… Alegrou-se nos dias de sol, entristeceu-se nos dias de sombras e escuridão.
Os olhos do apaixonado são diferentes. Neles mora uma pitada da loucura que se chama fantasia. O apaixonado vê como realidade aquilo que existe dentro dele como sonho. Versinho enorme de Fernando Pessoa: “Quando te vi, amei-te já muito antes”.
Traduzindo: vejo no seu rosto o rosto que já morava dentro de mim, adormecido… O apaixonado é um porta-sonhos."
Rubem Alves